A menina da foto
Leia ouvindo "Patron" - Tiago Iorc
Eu olho para aquela fotografia agora e vejo que tudo mudou. Aquela menininha de cabelos longos e castanhos, sobrancelhas mais ou menos feitas, meiga, com as mãos sob o queixo, de vestido nude e pulseiras de pérolas não é mais a mesma. Essa que acabo de citar representa uma garotinha que esperava muito por um futuro, mas que era feliz no presente e não sabia.
Ela foi mudando aos poucos, porque depois de algumas quedas, ela simplesmente cansou de ficar no chão e quis mais do que levantar. Ela quis ser mais ela, exprimir personalidade... tudo que ela buscava nos outros ela quis ser. Seus fios castanhos passaram a ruivos, a tatuagem de coração que havia feito com a irmã continuava tendo o mesmo significado - aliás, uma das poucas coisas que não havia mudado era o significado daquela imagem, o amor incondicional pela sua melhor amiga, companheira desde sempre. Mas ela via a emergência de voar.
Ok, todos nós chegamos em um ponto de frustração, porque descobrimos que voar é algo que não conseguimos, o ser humano chegou no ápice da tecnologia, até criou o avião, mas chegar a voar sozinho, ah... impossÃvel. Mas ela queria voar sem asas, ou sem tecnologia, que seja. Ela queria alçar em direção aos sonhos. Como pássaros recém nascidos, que deixam seus medos para trás e seguem em direção ao céu azul, porque sabem que lá a mansidão é maior.
Aquela coisa toda de tatuagem parecia um tanto sem sentido para pessoas que a vissem desfilar com os pássaros em tinta nas costas. Mas ela sabia o que carregava consigo: Naquela simples imagem ela enxergava seus pés saindo do chão, ela se via uma mulher independente, independente dos medos, da insegurança. Voando em direção ao futuro, aquele... isso... aquele futuro que a garotinha de cabelos castanhos esperava aos 12.
Não importava o que as pessoas falassem: lá vai a ruivinha - de farmácia, que seja. Aquilo era a personalidade. Não pronta e intacta, mas em processo de construção. E ela se descobria cada dia mais, e se construÃa. Com os livros que lia, com a graduação que escolhera, com os filmes que via e músicas que ouvia. Olhar para trás ainda fazia sentido, mas apenas para perguntar se aquela garota da foto estava satisfeita com o futuro que tanto esperou. Ao que ela respondia: ainda falta algo. E ela sabia o que era: não foi isso que sonhei o tempo todo? Não era isso que você queria cursar. Você não queria continuar na sua cidadezinha, com as mesmas pessoas.
Enquanto a garota da foto a repreendia, ela sentia que a vida havia mostrado outros caminhos, mas que talvez um dia fosse possÃvel, não voltar atrás, mas dar a volta e retornar aos sonhos que eram mais fortes que qualquer conspiração do universo. "Lá vai a ruivinha...". E esse cabelo? Deu a louca? Não. Ninguém sabe pelo que ela passou pra ficar assim. Mas mudanças fazem bem, olha lá... até ficou mais bonita! -O espelho dizia, e a moça concordava.
A graça da coisa toda foi essa. Crescer. Não importava por qual caminho ela estava indo, ela crescia e se descobria cada vez mais efêmera. "Então menina, eu sei que o tempo voa. Mas não deixe essa viagem toda passar em vão. Aproveite as portas abertas, quem sabe numa delas, não está escondido o seu sonho?" A vida gritava.
Joyce Costa, escrevendo sobre ela mesma.
0 comentários
Deixe seu coments! É de grande importância para nós! ;)